terça-feira, 14 de agosto de 2012

PORQUE EX -PRESIDIÁRIOS VOLTAM PARA CADEIA

Ex-presidiários voltam para criminalidade

O vendedor João (nome fictício), de 44 anos, foi encarcerado pela primeira vez quanto tinha acabado de completar maioridade penal, no estado de São Paulo. O ano era 1981 quando ele foi detido por assalto e encaminhado para uma das casas de detenção mais famosas do país: o Carandiru. Lá ele cumpriu cerca de 14 anos de uma pena de 74 anos.

Mas não somente lá, João fugiu e voltou sete vezes de presídios paulistas, além de ter passado por seis instituições carcerárias mineiras, isso tudo antes de decidir mudar de vida e deixar o crime. A mudança, contudo veio depois das muitas investidas na chamada “vida fácil”. Mas para quem já passou pelas grades de uma cadeia, a vida do lado de fora tem soado tão difícil quanto lá dentro, já que é baixo o número de egressos que superam o preconceito e conseguem uma vaga de emprego, para garantir um sustento e dignidade para suas vidas do lado de fora.

Mesmo com incentivo econômico por parte do governo estadual e programas sociais para reinserir o ex-presidiário à sociedade, no país a estimativa é de que sete a cada 10 ex-presidiários voltem à criminalidade. De acordo com o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), o índice de reincidentes no estado é o mesmo, cerca de 70%.

Para o juiz auxiliar da presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e coordenador nacional do Progama Começar De Novo, que estimula a reinserção de egressos por empresas privadas e públicas, Luciano Losekann, a perspectiva dos ex-detentos realmente não é boa.

Apesar de não falar de números ele acredita sim que seja grande a
quantidade de pessoas que, uma vez no mundo do crime, não voltam atrás. “O apenado sofre o estigma de ser ex-presidiário. A sociedade é muito desconfiada porque ele praticou um delito. Mesmo assim não se retira a razão da sociedade, porque muitas vezes quando uma pessoa está encarcerada o estado não oferece reinserção social para elas se reabilitarem. Dizemos que a prisão tem servido como fator criminógeno. São os maiores erros que temos cometido no Brasil”, declara.

Para ele, o tráfico de drogas é o principal setor do crime organizado que chama de volta os ex-detentos. “Muitas pessoas ingressam no sistema carcerário e retornam depois para o tráfico, sobretudo pela ausência de políticas sociais para grande parcela da sociedade brasileira. Quando essas políticas não são implantadas ou não têm rigor, o tráfico continua atraindo muito essas pessoas, geralmente de classes mais carentes. Não que justifique o cometimento do delito, mas ele é muito atrativo”, afirma.

Já o presidente da subsede em Betim da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Gilberto de Sá, acredita que o número divulgado no estado, referente à volta ao crime, é bem maior, principalmente devido às várias de portas fechadas que os egressos encontram no mercado de trabalho. “Existe um estigma na sociedade. É só falar que a pessoa é ex-presidiário e já começa uma barreira. O governo até tenta implantar programas, mas nunca vai para frente. Existe o incentivo, mas por causa desse estigma, eles acabam não trabalhando”, afirma.

O advogado criminal acredita que o número real de pessoas que voltam ao crime seja mais significativo, já que essa estatística não abrange os egressos que continuam na criminalidade e morreram nas ruas ou não são presos novamente. Para ele, no momento da volta à “liberdade” o crime não é simplesmente o caminho mais fácil, ele é o único caminho. “O destino da maioria é a reincidência. O sistema atual é perverso. Se ele tivesse uma oportunidade, talvez não estivesse no sistema, mas como ele não é preparado, a ida para o crime favorece mais”, declara.

Além disso, ele destaca que dentro da unidade prisional mais do que cumprir pena, muitas pessoas desenvolvem ainda mais suas habilidades criminosas. “Se ele não sabia como era, ele vai aprender muito mais sobre o crime. Quanto mais tempo ele passa lá, mais ele aprende com outros criminosos”, comenta.

Apesar de tudo, vida nova.
Esse é o caso de João. “Passei por 52 ‘cadeias’ no estado de São Paulo. Aqui em Minas cumpri pena no presídio de Bicas, no Ceresp São Cristóvão e no Gameleira, no presídio Martinho Drummond e na penitenciária José Maria Alkimin, os dois em Ribeirão das Neves, e na Nelson Hungria, em Contagem, de onde eu sai em liberdade condicional há 3 anos”, conta. Mas o período encarcerado não foi contínuo.

Nos intervalos de detenção, ele sempre voltava à vida do crime. No total, foram 16 assaltos a banco e dois a carros-forte, período no qual ele conta nunca ter sido violento contra nenhuma vítima. Para ele, o crime era simplesmente a opção mais fácil e prática para se conseguir dinheiro. “Eu tinha muita dificuldade, era o mais novo de sete filhos e minha mãe trabalhava o dia inteiro. Eu trabalhava de carregador em um supermercado e ganhava cinco, dez centavos de gorjeta. Aí revoltei com isso. Foi assim que comecei e nunca mais parei”, relata.

Ainda fugitivo, ele tentou arrumar um emprego. Mas como não podia assinar a carteira, as opções não eram tantas. Assim, João trabalhou durante dois anos como atendente em uma lanchonete, antes de ser preso novamente. A dificuldade em arrumar um emprego legítimo e honesto continuou após entrar em liberdade condicional, em 2008. Ele conta que no mesmo ano recebeu a notícia de que receberia baixa da pena, mas mesmo assim seria difícil para alguém com seu histórico conseguir superar os preconceitos e medos da sociedade. “No país em que a gente vive não tem jeito. É só falar que é ex-presidiário que você não arruma emprego”, afirma.

Atualmente, ele trabalha em uma barraca que vende produtos importados, no Centro de Belo Horizonte, além dos bicos ocasionais. “Só consigo coisas assim ou com conhecidos, porque qualquer outra coisa, que vá assinar a carteira, eu não consigo arrumar. Não tenho estudo e, infelizmente, não tem outra coisa. Se não for isso, é voltar para o crime, e o crime para mim não compensa mais. Meus filhos são minha vida e eu crio eles sozinho”, comenta. Ele destaca que a mudança de hábitos foi pensando nos três meninos que hoje ele cria sozinho, sem a participação das mães das crianças, que seriam usuárias de droga. “Saí pensando em cuidar dos meus filhos. Tentei muito ganhar dinheiro fácil, mas toda vez que tentava era preso. Aí eu decidi parar, sem dinheiro, sem nada, mas na rua, que é mais importante. Decidi mudar de vida porque eu precisava cuidar dos meus filhos mesmo”, conta.

Hoje os quatro vivem, sem luxo, em uma casa pequena, em Betim. O salário de vendedor cobre as demandas mais básicas e “o dinheiro dá para comer, comprar roupas, material escolar e pagar as dívidas”, tudo isso, levando uma vida simples, sem mordomias. Mesmo assim, ele prefere a vida sem o risco de voltar para detrás das grades. “Se eu pudesse voltar atrás, não queria ter passado um terço do que eu passei na vida. Se tivesse alguma oportunidade (de trabalho melhor) é lógico que eu ia abraçar com unhas e dentes, mas não tem. Não adianta falar que tem, porque não tem”, confessa. “Para a Justiça, se a pessoa saiu da cadeia ela está em liberdade, mas para a sociedade você é um presidiário toda a vida”, destaca.

Educação e capacitação profissional necessárias

Além da questão do preconceito, sobre a qual Gilberto de Sá fala e João* confirma, existe um outro grande problema entre os egressos: a falta de capacitação. “Eles já entram para o sistema porque não tem educação, nem preparo, no geral. Também tem a questão de que o dinheiro vem mais fácil, porque o mercado (do crime) é realmente mais rentável que o normal. Mas, além dessa situação, ele sai sem uma profissão ou especialização em alguma área”, afirma o advogado. “Alguns poucos conseguem vagas em empresas familiares, por meio de indicação. Mas são muito poucos”, comenta.

No caso das pessoas em prisão condicional, que aguardam um julgamento, a situação é a mesma. “Eles também ficam impedidos de regularizar sua situação e, portanto, não conseguem emprego. Temos vários casos de pessoas que precisam de um atestado de bons antecedentes, mas não conseguem porque estão aguardando uma sentença judicial”, afirma.

A grande maioria das empresas, na opinião do advogado, não quer aceitar pessoas com um histórico criminal como funcionário. “A própria sociedade que coloca ele lá dentro (da cadeia), dificulta que ele volte à vida normal. A tendência então é partir para o meio fácil”, completa.
Para ele, a reabilitação só será possível mediante um pacto social para melhorar o sistema prisional. “Acho que quando vamos discutir a questão de segurança pública as pessoas falam muito em policiamento.

Mas a questão está muito antes disso, na educação, que é o principal. Se você tem mais escolas, vai diminuir a construção de cadeias”, pontua. “Além disso, à médio prazo, também temos que dar oportunidade à quem está lá dentro de ter uma formação, mesmo que de maneira tímida, porque temos bons profissionais lá dentro”, declara.

Para o juiz auxiliar da presidência do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), Luciano Losekann, a chave do sucesso é educação e capacitação. “Há de se quebrar esse círculo vicioso, não só com o judiciário mas também com políticas sociais, de geração de renda e educação”, destaca.
FALA-SE MUITO PELOS VEÍCULOS DE COMUNICAÇÃO SOBRE O EGRESSO,RESSOCIALIZAÇÃO...ETC E TAL.MAS SÓ QUEM FOI PRESO POR MUITOS ANOS , SAÍU E QUER LEVAR UMA VIDA DIGNA ,SABE DAS DIFICULDADES...PORQUE CASO MUDE VIDA.ELE IRÁ CONTRARIAR O SISTEMA...QUE TORCE PARA ELE VOLTAR PARA CADEIA...

11/08/2012

Os direitos mínimos da população carcerária

"O mais alarmante, no sistema prisional brasileiro, é que as pessoas, ali recolhidas, retornam piores ao convívio social"
 
A população carcerária brasileira alcançou, em dezembro de 2011, a marca histórica de 514.582 presos, tornando-se, portanto, o terceiro país mais encarcerador do mundo. E o que mais assusta é o crescimento de 472% no número de presos nas últimas duas décadas, pois, em 1990, tínhamos 90 mil encarcerados. Já o número de presídios construídos cresceu 253%, demonstrando a existência de um déficit prisional, significando dizer que, a se manter o ritmo atual, dificilmente conseguiremos equalizar essa diferença.
A conta simplesmente não fecha. No Estado do Ceará, temos encarceradas 17 mil pessoas, ocupando a 2ª posição no Nordeste, com um contínuo crescimento no número de presos.

Porém, o mais alarmante, no sistema prisional brasileiro, é que as pessoas, ali recolhidas, retornam piores ao convívio social. Para reger o bom andamento do nosso sistema carcerário, a Lei de Execução Penal (Lei nº 7.210), de 11 de julho de 1984, observou as linhas dos principais documentos internacionais sobre a matéria, como as Regras Mínimas para o Tratamento de Reclusos, adotadas pela Assembleia Geral das Nações Unidas, de 1990, e a Convenção Americana de Direitos Humanos (Pacto de San Jose da Costa Rica). Há, ainda, a Resolução número 14, de 11 de novembro de 1994, do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, que fixa as regras mínimas para o tratamento de presos no Brasil.

O Projeto de Lei 2230/11 que institui o Estatuto Penitenciário Nacional é mais uma tentativa de garantir os direitos mínimos dos presos. Referido projeto de lei traz, basicamente, as regras contidas na Resolução nº 14/1994, do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. Essas diretrizes deveriam ser aplicadas juntamente com a Lei de Execução, sem a necessidade, portanto, da aprovação de mais uma lei com um grande risco de não ser cumprida.

Na realidade, falta vontade política para a concretização desses direitos, porquanto todos os dispositivos acima são descumpridos, quase de forma integral, pelo Poder Executivo. E, com esse descumprimento, toda a sociedade é prejudicada, pois, sem um mínimo de tratamento digno e de ressocialização, os índices de violência urbana só tendem a aumentar, em grandes proporções.

A Defensoria Pública do Estado do Ceará, como órgão da Execução Penal, tem atuado com o objetivo de velar pela regular defesa dos presos, de forma individual e coletiva, buscando sempre a correta aplicação da Lei de Execução Penal, objetivando, assim, beneficiar toda a população.

Há muito tempo, estamos incorrendo no mesmo erro, tendo em vista que, em um país onde se investe mais em presídios do que em escolas, algo muito grave está acontecendo. Devemos atacar as causas, e não as consequências. Com dizia o filósofo Pitágoras de Samos: “Educai as crianças e não será preciso punir os homens”.

POR FIM DIGO QUE ;
"INAUGURAR ESCOLAS E FACULDADES PÚBLICAS É  O MESMO QUE FECHAR PORTAS DE PENITENCIÁRIAS..."
SERÁ QUE INTERESSA A QUEM ???