segunda-feira, 25 de junho de 2012


Prática da tortura no Brasil


Lamentavelmente, a tortura não é uma prática usada somente durante períodos de exceção, como o Estado Novo e a ditadura Militar de 1964-85[8]. Em tais momentos históricos houve a supressão expressa das garantias e direitos fundamentais do cidadão e a tortura era aplicada amplamente contra os que se opunham a estes regimes autoritários.

Entretanto, hoje em dia, em pleno Estado de Direito, a tortura continua sendo praticada, principalmente pela polícia. De acordo com o Relatório Anual da Anistia Internacional de 2006, parcelas mais pobres da população brasileira têm sido continuamente vítimas de tratamentos classificados como tortura. A ausência de um maior envolvimento da sociedade civil no combate à tortura fortaleceria a atitute opressiva de autoridades policiais no desempenho de suas funções, o que favoreceria a continuidade da utilização do emprego de tratamentos desumanos e cruéis à cidadãos que se encontrem em regime de pena privativa de liberdade e no ato de detenções. As práticas de tortura, “desde que aplicadas aos ‘diferentes’, ‘marginais’ de todos os tipos, (...) são em realidade aceitas, embora, não defendidas publicamente”.(cfe. COIMBRA:2000) Denúncias de movimentos sociais descrevem condutas ilegais contra cidadãos em bairros de baixa renda e, principalmente, contra pessoas sob tutela do Estado, como por exemplo, adolescentes da Febem[9] de São Paulo, contradizendo as normas jurídicas e o propósito da instituição. Segundo o relatório “Destruindo o Futuro: Tortura na Febem” os internos são “alijados de seus direitos básicos e fundamentais previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente, (...) está em curso uma rotina de desrespeito, humilhação e tortura”. Esta é uma situação que não quer ser vista pela sociedade e que é aceita e permitida pelo poder público.

Tão grave quanto o descaso do poder público e a falta de mobilização da sociedade civil é a tendência à tolerância da tortura observada na jurisprudência de alguns tribunais brasileiros. Poder-se-ia dizer que, apesar da vedação expressa da tortura no nosso ordenamento jurídico, esta parece estar sendo contraditoriamente pouco a pouco institucionalizada. Um juiz auditor militar no Rio de Janeiro “admitiu que é possível o uso ‘do rigor necessário’ para a descoberta de um delito” (GOMES:2006). A confissão como prova de um crime, mesmo que haja indícios de maus-tratos, tem sido admitida pelos tribunais brasileiros. Neste caso, há mais de uma contradição rondando a questão, pois, além do crime de tortura em si, esta tendência contradiz os princípios do devido processo legal, ao se admitir como constatação de um crime uma prova forjada através de meios ilícitos. Como pode-se constatar, a utilização da tortura no Brasil tem origem, na maioria dos casos, na esfera das autoridades públicas policiais e contando ainda com a corroboração do Poder Judiciário.

Esta tendência se contrapõe a avanços conquistados em relação aos direitos humanos universais e à função do Judiciário, qual seja a de garantir o cumprimento da lei e harmonizar os conflitos. O estabelecimento de critérios subjetivos para a condução de um procedimento penal no momento do interrogatório pode levar a atos indiscriminados e arbitrários, pois não há uma definição clara, por exemplo, do que seja “rigor necessário”. E na falta de um critério explícito que atenda às regras de direitos humanos, o agente poderá estabelecer tal “rigor” da forma como lhe convém ser o “necessário” como método interrogatório. Todo ato incisivo que possa vir a atingir a integridade física e psicológica de um ser humano será considerado tortura: “a tortura é sempre, mesmo que esta seja regulamentada, de uma forma extrema, o exercício de poder do torturador ou de seu mandatário sobre o torturado. Através disso a autoridade é produzida, encenada e mantida”. (MARX, 2004:5) Esta postura é contraditória ao Estado Democrático e de Direito, que se baseia também, entre outros princípios, na inviolabilidade da dignidade humana de acordo com o Art1.° da Declaração Universal dos Direitos do Homem da Organização das Nações Unidas.

Nenhum comentário:

Postar um comentário